Acordo político entre Forças Progressistas e a Direita Tradicional para derrotar a Extrema-Direita é viável? Depende!

Acordo político entre Forças Progressistas e a Direita Tradicional para derrotar a Extrema-Direita é viável? Depende! - Marcos Doniseti!
Lula sendo carregado pelo povo no Sindicato dos Metalúrgicos, no dia 09/11/2019, um dia após a sua libertação.

Pacto Político: Qual é a chance de acontecer?

Acabei de ler um texto com uma análise interessante e, em grande parte, correta do Luís Nassif, principalmente na questão da necessidade de se derrotar a Extrema-Direita bolsonarista, a fim de impedir um Golpe de Estado por parte da mesma e, também, visando derrotar a mesma nas eleições que irão se realizar em 2020 e em 2022.

Nassif defende que as forças Progressistas, lideradas por Lula, e a Direita Tradicional (que o Nassif chama de Centro-Direita) deveriam se unir para derrotar as forças políticas do Bolsonarismo e da Extrema-Direita nas próximas eleições (em 2020 e, principalmente, em 2022).

Oras, que isso é necessário eu também estou de acordo. Mas é preciso definir quem irá abrir mão do que. Acordo pressupõe concessões de todas as partes envolvidas e não apenas de um lado.

Além disso, entendo que essa ideia de Pacto entre as Esquerdas Progressistas (lideradas por Lula) e a Direita Tradicional tem um ponto fraco de caráter estratégico, que é o seguinte:

Luis Nassif afirma que uma parte da Centro-Direita (na verdade, a Direita Tradicional) aceitaria um 'Pacto' político com as forças Progressistas lideradas por Lula visando derrotar o Bolsonarismo.

Neste momento, pode até ser que uma parte da Direita Tradicional aceite fazer esse Pacto, o que também é muito duvidoso, pois a mesma irá resistir bastante a fazer concessões.

Mas a questão principal é o Pós-Pacto.

Afinal, quem garante que essa Direita Tradicional irá respeitar os termos deste eventual Pacto? Historicamente, a Direita Tradicional já rompeu com inúmeros Pactos Políticos durante a história do Brasil, promovendo inúmeros Golpes de Estado e implantando Ditaduras, como a do Estado Novo (1937-1945) e a Ditadura Militar (1964-1985). 
Ulysses Guimarães segura o livro com o conteúdo da Constituição de 1988, que representou um Pacto Político que foi destruído pelo Golpe de 2015/2016.

A Constituição de 1988 - Um Pacto Político rompido!

Uma Constituição, desde que seja devidamente elaborada e aprovada de forma democrática, já é, ela mesma, um grande Pacto Político que é assinado por todas as forças políticas e sociais organizadas de um país em um certo momento históricos.

Portanto, não se pode esquecer que já tínhamos um Pacto Político vigorando no Brasil, que era aquele que foi construído com a elaboração da Constituição de 1988 e que foi liderado e montado por Ulysses Guimarães. Assim, a Constituição de 1988 expressava o Pacto Político que foi acordado no momento da sua elaboração. 

A chamada 'Constituição Cidadã', que passou a vigorar em Outubro de 1988, determinou que o Brasil Pós-Ditadura Militar seria construído com base em alguns princípios bem definidos e que, nos últimos anos, a Direita Tradicional (Centro-Direita, para Nassif) rompeu com todos os princípios estabelecidos pela mesma e aos quais comento abaixo. 

Os princípios estabelecidos pela Constituição de 1988 são os seguintes:

A) Democracia Liberal e Constitucional!

Sistema caracterizado pela existência de um sistema partidário plural, mas que é excessivamente fragmentado e frágil, pois não existe, na prática, fidelidade partidária e não temos cláusula de barreira.

Isso faz com que tenhamos quase 30 partidos políticos com representação no Congresso Nacional, situação inexistente em qualquer país do mundo que também adote a Democracia Liberal e Constitucional.

Além disso, a Constituição foi deixada de lado para poder derrubar Dilma e prender Lula.

Dilma foi derrubada em função de patéticas 'pedaladas fiscais', que são uma prática comum na administração pública brasileira e que sempre foram consideradas normais, tanto que inúmeros governadores de estado a praticam já há muitos anos. 

FHC também 'pedalou' e não foi derrubado do cargo em função disso.

E o ex-Presidente Lula foi condenado com base em 'atos de ofício indeterminados', ou seja, com base em NADA.
Minha Casa Minha Vida: Durante os governos Lula e Dilma foram construídas e entregues 2,5 milhões de moradias que foram destinadas à população de baixa renda. Mas o orçamento do programa para 2020 é o menor da história. 

B) Presidencialismo Parlamentar (também chamado de Presidencialismo de Coalizão)!


Neste sistema o Congresso Nacional é quem detém a última palavra em todos os assuntos, como o reajuste do Salário Mínimo, o Orçamento da União, a nomeação de ministros do STF, do presidente e dos diretores do Banco Central, dos Embaixadores, a criação de programas sociais. Tudo precisa ser aprovado no Congresso Nacional. 

Tal sistema obriga a que o (a) Presidente (a) da República, independente de quem seja, venha a ter uma política de diálogo permanente com a Câmara dos Deputados e com o Senado a fim de desfrutar de um mínimo de estabilidade política e institucional para que possam governar.

Os dois presidentes da República (Collor e Dilma) que perderam o apoio do Congresso Nacional, após 1988, foram derrubados do cargo por este mesmo Congresso, embora isso tenha acontecido por razões muito diferentes.

No segundo mandato de Dilma, por exemplo, tivemos um presidente de Câmara dos Deputados (Eduardo Cunha) que aprovava inúmeros projetos de lei que visavam arrebentar as contas públicas (chamados de Pautas-Bomba), com o objetivo de jogar o país na crise econômica e social e usar a mesma para derrubar Dilma da Presidência da República.

Portanto, a Constituição de 1988 obriga a que exista um diálogo permanente entre os poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário), sem o qual nenhum Presidente consegue governar. 
Os investimentos federais atingiram o seu patamar máximo em 2014 (R$ 99 Bilhões), mas a partir do governo Temer eles passaram a ser drasticamente reduzidos. E para 2020 o valor investido será ainda menor, de ridículos R$ 19,4 Bilhões.

C) Construção de um Estado de Bem-Estar Social!

Foi graças a isso que tivemos a criação do INSS, que reúne Previdência Social, Saúde Pública e Assistência Social.

A Constituição de 1988 estabeleceu um patamar mínimo para investimentos na Seguridade Social (criando 5 fontes de financiamento para a mesma: CSLL, Cofins, PIS/PASEP, Loterias e Contribuições de Empresários e Trabalhadores) e para investimentos na Educação.

No entanto, a partir do governo Temer, o Estado de Bem-Estar Social passou a ser destruído (vide as Reformas Trabalhista, da Previdência, o Teto de Gastos, etc).

Além das mudanças constitucionais (como o Teto de Gastos) que limitaram os investimentos sociais, nós estamos vendo o desmonte das política sociais que foram criadas ou aprofundadas pelos governos de Lula e Dilma, tais como:

- Aumento Real Anual para o Salário Mínimo;

- Minha Casa Minha Vida;

- Mais Médicos;

- Bolsa Família;

- Luz Para Todos;

- ProUni;

- FIES;

- Ciência Sem Fronteiras.
A taxa de desemprego despencou no Brasil entre 2003 e 2014, durante os governos de Lula e Dilma, com o índice de 2014 (média anual) sendo o menor da história do país. Em 2019 o Brasil está com uma taxa de desemprego muito maior (11,8%) sendo que os desempregados terão que contribuir com o INSS (7,5%). 


Esse 'Estado de Bem-Estar Social', previsto na Constituição de 1988, passou a ser, em grande parte, implementado, ampliado e aprofundado pelos governos de Lula e Dilma, que tiraram a Constituição do papel e a colocaram em prática, por meio das políticas sociais citadas acima.

No entanto, esse 'Estado de Bem-Estar Social' começou a ser desmantelado pelo governo Temer, que foi um governo de Direita Tradicional (a Centro-Direita de Nassif), e agora tal política de desmonte está sendo aprofundada e radicalizada pelo governo Bolsonaro, que colocou um Neoliberal de inspiração Pinochetista (Paulo Guedes) para comandar a economia do país.

E a questão é saber se, com esse Pacto Político que está sendo proposto, a Direita Tradicional abandonará a política de desmonte do Estado Nacional brasileiro, de destruição da Constituição de 1988 e das políticas sociais que foram implantadas no país a partir do governo Lula.
Em 2011, durante os governos Lula e Dilma, o Brasil chegou a possuir o sexto maior PIB do Mundo, ultrapassando o Reino Unido. PIB do Brasil chegou a US$ 2,4 Trilhões de Dólares em 2014, enquanto que a Renda Per Capita atingiu os US$ 11.800 Dólares. 

D) Economia Mista: Intervenção Estatal Iniciativa Privada (nacional e estrangeira)!

Esse modelo se baseava no Nacional-Desenvolvimentismo e previa a participação relevante do Estado na promoção do desenvolvimento econômico do país, ao lado do Capital privado (nacional e estrangeiro).

Porém, a Economia Mista prevista na Constituição de 1988 está sendo aniquilada, com tudo sendo privatizado e entregue para o Livre Mercado Desregulado.

Tal política, no âmbito da atuação por parte do Estado, foi aprofundada pelos governos do PT, vide o Regime de Partilha do Pré-Sal e a política de Conteúdo Nacional para o setor de Energia (Petróleo e Gás) e de Construção Naval.

Até a proibição da construção de novas escolas públicas faz parte do projeto de Paulo Guedes, a fim de se abrir mais espaço para o Ensino Privado, que passaria a ser hegemônico.

E a chamada 'reforma' da Previdência recentemente aprovada pelo Congresso Nacional (com a aprovação total da Direita Tradicional) adotou regras que reduzem o valor dos benefícios e que dificultam a obtenção dos benefícios. 
O trabalho informal (precário, temporário) despencou durante os governos Lula e Dilma, caindo de 51,8% (2002) para 37,5% (2015), acumulando uma diminuição de  27,6%.

E) Defesa da Soberania e da Integração da América Latina!

A Defesa da Soberania foi jogada no lixo, como fica claro pela entrega do Pré-Sal para o Capital Estrangeiro, pela entrega da Base de Alcântara para os EUA, pela entrega da Embraer para a Boeing e pela permissão para desmatar a Amazônia (abrindo novos territórios para exploração de minérios, fazendas de soja e de criação de gado).

O processo de integração da América Latina foi jogado no lixo, com o Brasil participando do processo de desmonte da Unasul, da Celac e esvaziando o Mercosul.

Além disso, o governo Bolsonaro passou a participar das articulações de bastidores e a apoiar movimentos golpistas para derrubar os governos democraticamente eleitos da Venezuela (Maduro) e da Bolívia (Evo Morales).

Portanto, agora o Brasil é um país que contribui para desestabilizar os países soberanos da América Latina, o que é uma política claramente inconstitucional e que deveria levar ao Impeachment de Bolsonaro.

Não se conhece, da parte da Direita Tradicional, qualquer oposição real e efetiva contra essas políticas que comentei aqui. Na verdade, a Direita Tradicional foi quem aprovou todas essas medidas e políticas, pois a Extrema-Direita bolsonarista jamais conseguiria aprovar as mesmas, dado o pequeno número de parlamentares que possui.

A única preocupação verdadeira dessa Direita Tradicional é com a possibilidade da Extrema-Direita bolsonarista levar adiante um Golpe de Estado que promovesse a implantação de uma Ditadura Neofascista e que faria dela, Direita Tradicional, uma vítima desta Ditadura.
O desmatamento na Amazônia despencou de 21.651 quilômetros quadrados (2002) para 6.207 quilômetros quadrados (2015), acumulando uma redução de 71% durante governos Lula e Dilma. Em 2019 a destruição da floresta chegou a 9.762, aumentando 57,3% em comparação com 2015 (último ano completo do governo Dilma). Será que a Direita Tradicional irá parar de apoiar o desmonte da política de proteção ambiental adotada no governo Bolsonaro?

O Pacto Político é possível?

Garantir que o Brasil continue sendo uma Democracia Liberal e Constitucional é fundamental, não resta a menor dúvida. Mas para evitar que isso aconteça é necessário que ela seja restaurada, para que volte a funcionar de forma plena.

No entanto, entendo que é preciso muito mais do que isso.

A Direita Tradicional tem que parar de aprovar essa política de desmantelamento do Estado Nacional, de entrega das riquezas e do patrimônio estratégico do país e de destruição das políticas de Bem Estar Social e de Seguridade Social. 

E penso que essa Direita Tradicional não fará isso. 

Afinal, não podemos esquecer que o processo que levou à aprovação das reformas da Previdência, Trabalhista, Terceirização Generalizada, da entrega do Pré-Sal, da Embraer e da Base de Alcântara para os estrangeiros foram todas implantadas por um governo de Direita Tradicional (Temer) que contou com o total apoio dos partidos conservadores tradicionais (MDB, DEM, PSDB, PP, PSD, PL, PTB).

Assim, qualquer acordo político que venha a ser feito entre as forças Progressistas (lideradas por Lula) e as da Direita Tradicional deve passar pela retomada das políticas de respeito à Constituição de 1988, de defesa da Democracia Constitucional, de defesa do Bem-Estar Social, da Economia Mista, da Soberania e da Integração da América Latina.
Argentina: No final de 2019, governo Macri, a situação da Argentina era muito pior do que no final do governo de Cristina Kirchner, deixando claro o total fracasso das políticas Neoliberais macristas. E agora o mesmo modelo fracassado está sendo imposto ao Brasil, o que ocorre desde o governo Temer. 

Se isso não for acordado, as forças Progressistas estarão apenas servindo como ponto de apoio para o retorno da Direita Tradicional ao poder, mas sem que qualquer uma das equivocadas e catastróficas políticas que foram adotadas a partir do governo Temer venham a ser revertidas.

E sem essa reversão o Brasil não será jamais um país democrático, justo, soberano, desenvolvido e integrado à América Latina. E assim a Constituição de 1988 terá sido definitivamente enterrada.

Um acordo com base nestas condições, sem reversão destas políticas nefastas, será benéfico apenas para a Direita Tradicional, pois somente as forças Progressistas estarão fazendo concessões. E um acordo político exige concessões de ambos os lados.

E daí, temos que perguntar: Quais são as concessões que a Direita Tradicional está disposta a fazer? 

Sem que isso fique bem claro, não existirá acordo algum, mas apenas uma mera rendição das forças Progressistas para a Direita Tradicional.

E isso é inaceitável.
As vendas do Comércio Varejista brasileiro despencaram com o Golpe de 2015/2016, atingindo o seu menor patamar em 2017 (governo Temer) e em 2019 ainda estão bem abaixo do patamar máximo, que foi atingido em 2015, último ano completo do governo Dilma. Assim, o Brasil caminha para mais uma Década Perdida em termos de crescimento econômico. 
Link:


Bolsa Família encolhe - Bolsonaro reduz o número de beneficiários do programa:
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/11/20/em-6-meses-governo-exclui-115-milhao-do-bolsa-familia-e-programa.htm

Salário Mínimo sem aumento real:
https://www.redebrasilatual.com.br/economia/2019/10/bolsonaro-retarda-crescimento-economico-e-justica-social-com-salario-minimo-sem-aumento-real/

Fim do Mais Médicos deixa centenas de cidades sem atendimento:
https://www.abrasco.org.br/site/outras-noticias/opiniao/mais-medicos-apos-saida-de-cubanos-42-das-cidades-tem-vagas-abertas/40961/

Bolsonaro - Orçamento do Minha Casa Minha Vida é o menor da história; Programas sociais sofrem grande corte no Orçamento de 2020:
https://www.cartacapital.com.br/politica/bolsonaro-impoe-menor-orcamento-da-historia-ao-minha-casa-minha-vida/

Desmatamento na Amazônia cresce quase 30% em 2019:
https://g1.globo.com/natureza/noticia/2019/11/18/desmatamento-na-amazonia-cresce-entre-agosto-de-2018-e-julho-de-2019-diz-inpe.ghtml

A Dívida Pública Bruta (linha azul) despencou de 81% do PIB (2002) para 60% do PIB (2015), enquanto que a Dívida Pública Líquida desabou de 60% do PIB (2002) para 35% do PIB (2015).

Quem recebe Seguro-Desemprego terá que pagar contribuição de 7,5% para o INSS:
https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2019/11/11/quem-recebe-seguro-desemprego-pagara-75-de-inss.htm

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